Até algum tempo atrás, mulheres não tinham o direito de fazer escolhas. Sequer podiam escolher os próprios parceiros! O surgimento da pílula anticoncepcional e o movimento feminista quebraram paradigmas e trouxeram uma nova consciência sobre o feminino. Isso foi importante para questionar uma visão de mundo, que vigorou até os anos 60.
Mudamos nosso posicionamento na sociedade e passamos a desempenhar um novo papel, muito mais presente e ativo. A partir daí, passamos a acreditar na idéia de que para sermos fortes, bem sucedidas e conquistar respeito deveríamos ser e agir dentro do padrão masculino vigente. Isso demonstra o quanto os valores da sociedade patriarcal estavam arraigados à consciência das próprias mulheres! Sim, pois há um pressuposto subliminar de que ser homem é ser "melhor", então, seremos como eles!
A absoluta falta de referencial nos levou a entender que, na busca por igualdade, deveríamos ser como os homens, como aqueles homens. E, de verdade, para quebrar valores tão fortemente construídos ao longo de séculos, esse parece ter sido o único caminho possível!
Mas, de que igualdade estamos falando?
Não podemos nos esquecer de que hoje, embora tenhamos ganho espaço no mercado de trabalho e apesar de tantas conquistas, ainda lutamos por respeito, reconhecimento e equiparação salarial. É preciso refletir sobre quais foram os ganhos (e, certamente, foram muitos!), mas também sobre o que deixamos para trás e o que ainda podemos ganhar com uma nova mudança de pensamento.
É fato que quando passamos a pensar, a funcionar e a agir como os homens, ficamos independentes. Mas sem perceber, começamos a acreditar que poderíamos prescindir do masculino e acabamos com um vazio no campo do relacionamento em nossas vidas. Ficar independente é prescindir de uma relação de dependência com o masculino, mas para isso não precisamos abdicar do outro, tampouco estabelecer uma relação competitiva, de poder com o parceiro.
Muitas mulheres só costumam se dar conta disso quando ficam diante da solidão, ou quando passam por mudanças importantes em suas vidas. E é nesse momento que saem em busca de uma identidade... saem em busca do que é ser mulher.
Com uma certa frequência ouço em meu consultório: "Será que ser mulher é viver à sombra de um homem atendendo suas vontades e reproduzindo os seus desejos?
" Não! Certamente, não! Precisamos nos reinventar, aprender uma nova forma de convivência com o masculino, na qual possamos somar, respeitar e ser respeitadas. Exercer a própria individualidade não é prescindir do outro. Se fizermos isso, acabaremos por prescindir também do que um relacionamento pode nos trazer de bom, criativo e prazeroso.
Passados cinqüenta anos, talvez seja o momento de refletir...
Devemos mesmo ser como os homens? Será que temos a mesma natureza?
Não creio. Acredito que temos os mesmos potenciais, a mesma força interna, uma imensa riqueza criativa, a mesma competência, importância e direitos, mas somos seres de naturezas distintas. Nem melhores, nem piores. Apenas diferentes...
Será que somos menos mulheres, por gostarmos de receber uma gentileza de um homem ou por, secretamente, vivermos fantasias românticas ou querermos encontrar um amor?
Também, não! Mulheres podem ser doces e fortes. Podem ser independentes e gostar de certos mimos. O que importa é a segurança interna de quem somos e do que somos.
Parece haver, atualmente, uma "crença" de que é feio uma mulher gostar do que antigamente eram consideradas "coisas de mulher " – flores, atenção, esperar um telefonema no dia seguinte, etc.
Não são poucas as mulheres que negam para si mesmas essas expectativas por se sentirem desvalorizadas socialmente. Às vezes, só contam isso para seus terapeutas e mantêm, externamente, uma imagem do que acreditam ser uma mulher independente.
Acredito que, para resgatar esses aspectos, precisamos romper com alguns estereótipos reforçados pela consciência patriarcal. Um deles é de que existem coisas de mulher e coisas de homem. Isso não é verdade! O que existem são padrões femininos e masculinos que podem estar presentes tanto na psique masculina, quanto na feminina.
Em segundo lugar, se, por exemplo, um homem abre a porta do carro para a mulher e ela gosta, isso não quer dizer que ela não possa abrir a porta do carro para si mesma! Não é sinônimo de incapacidade, fragilidade, incompetência ou mesmo de carência. Parece que algumas mulheres estigmatizam essas atitudes e negam para si mesmas gostar de receber esse tipo de gentileza.
Por outro lado, não podemos cair na armadilha de que todas gostamos ou esperamos essas atitudes do masculino. Isso também não é verdade! Se pensarmos assim, correremos o risco de novamente criar um estereótipo do que é ser mulher. Há mulheres que, não só não fazem a menor questão, mas que não gostam de atitudes como essas! E tudo bem também! Não são menos mulheres por isso. Assim como há muitos homens que sentem prazer em ter esse tipo de atitude e outros que nem se preocupam com isso. Não são menos homens por isso!
Cada um de nós expressa sua atenção e seu afeto pelo outro de forma muito singular. O que me parece mais importante é que possamos entrar mais em contato com nosso universo interno e agir de acordo com nossas reais expectativas e desejos, sem pressuposições preconceituosas e estereotipadas, ou ainda, sem tanta preocupação com valores e expectativas externas que, muitas vezes, não nos representam e não falam a respeito de quem somos realmente!